Resumo.
O presente artigo tem como objetivo apresentar um breve contexto histórico sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), discutir a mudança jurisprudencial ocorrida no âmbito da mais alta Corte brasileira, o Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou a inconstitucionalidade do § 5º, do art. 23, da lei 8.036 de 1990, com a mudança do prazo prescricional de 30 (trinta) anos para os últimos 5 (cinco) anos para se reclamar o não recolhimento dos valores referentes ao FGTS, para, ao final, fazer uma análise das consequências justrabalhistas da modulação de efeitos da decisão, que afetam diretamente o interesse dos trabalhadores e empresários.
Palavras-Chave.
FGTS (Fundo de Garantia de Tempo de Serviço). Prescrição. Modulação de efeitos. Supremo Tribunal Federal.
Introdução
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) foi criado com o objetivo de proteger o trabalhador demitido sem justa causa, mediante a abertura de uma conta vinculada ao contrato de trabalho, em que, no início de cada mês, os empregadores depositam junto à instituição financeira gestora do fundo, atualmente a Caixa Econômica Federal, o valor correspondente a oito por cento do salário de cada funcionário.
Até o ano de 1966, a única garantia que o empregado poderia dispor nos casos de despedida arbitrária, era circunscrita para aqueles que completava 10 (dez) anos de trabalho e adquiriam aquilo que ficou conhecido como estabilidade decimal, que tornava o obreiro estável, não podendo o empregador demiti-lo sem justa causa.
O grande problema neste sistema era que os empregados com menos de 10 (dez) anos de serviços, não tinham qualquer proteção para as demissões arbitrárias e, ainda, muitas empresas demitiam os seus trabalhadores antes dos 10 (dez) anos de serviços, justamente para evitar a garantia da estabilidade.
Desta maneira, em um cenário em que vigia a quase total ausência de proteção laboral, Castelo Branco sanciona a Lei nº 5.107 de 13 de setembro de 1966, que passou a integrar o ordenamento jurídico brasileiro e criou o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), de forma que o empregado poderia optar por qual regime iria permanecer, no sistema de estabilidade decenal ou do FGTS, sendo, portanto, um regime facultativo.
Com a promulgação da Constituição da República em 1988, o sistema de proteção decenal foi revogado, trazendo como sistema único o FGTS. Em seguida, em 1989, a Lei nº 5.107/1966 foi revogada pela Lei nº 7.839/1989, que, posteriormente, foi revogada pela, atual e vigente, Lei nº 8.036/1990, trazendo novas regras e ainda regulando o sistema de transição para os antigos decenários.
Digna de nota é a síntese feita pela Desembargadora Vólia Bomfim Cassar[3] ao descrever que:
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço é atual, única e genérica proteção legal ao tempo de serviço do empregado, em substituição ao antigo regime previsto na CLT – art. 478. Em favor do empregado são depositadas, sem qualquer desconto salarial, em instituições bancárias indicadas pela lei, importâncias mensais correspondentes a 8% da remuneração paga pelo empregador ou por terceiros (ex.: gorjetas). Estas importâncias de acordo com a legislação, poderão ser total ou parcialmente levantadas quando da terminação do contrato ou nos casos legalmente previstos (aposentadoria, morte, etc).
Atualmente, todos os empregados, regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), são vinculados ao FGTS, o que lhes oportuna o direito de realizar os saques dos valores retidos na conta vinculada, entre outros motivos, em caso de demissão sem justa causa.
Razões que propiciam o Levantamento dos Valores depositados.
A Constituição Federal trouxe em seu artigo 7º a proteção dos direitos fundamentais sociais, determinando a proteção contra a despedida arbitrária:
CF. ART. 7º são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
i – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; *grifos nossos
Neste sentido, no mesmo dispositivo constitucional, foi criado o FGTS:
III – fundo de garantia do tempo de serviço;
Nesse sentido, a Lei nº 8.036/1990, atualmente vigente, regula o FGTS e descreve quais são os motivos pelos quais pode ser feita a movimentação da conta vinculada, sendo o principal a despedida arbitrária e, em alguns casos específicos, a movimentação ocorre em virtude da aposentadoria do titular, fechamento de empresa, doenças graves e aquisição de imóveis. Disciplina a referida Lei:
lei 8.036/1990. Art. 20. A conta vinculada do trabalhador no FGTS poderá ser movimentada nas seguintes situações:
I – despedida sem justa causa, inclusive a indireta, de culpa recíproca e de força maior; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.197-43, de 2001)
I-A – extinção do contrato de trabalho prevista no art. 484-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto- Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
II – extinção total da empresa, fechamento de quaisquer de seus estabelecimentos, filiais ou agências, supressão de parte de suas atividades, declaração de nulidade do contrato de trabalho nas condições do art. 19-A, ou ainda falecimento do empregador individual sempre que qualquer dessas ocorrências implique rescisão de contrato de trabalho, comprovada por declaração escrita da empresa, suprida, quando for o caso, por decisão judicial transitada em julgado; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)
III – aposentadoria concedida pela Previdência Social;
IV – falecimento do trabalhador, sendo o saldo pago a seus dependentes, para esse fim habilitados perante a Previdência Social, segundo o critério adotado para a concessão de pensões por morte. Na falta de dependentes, farão jus ao recebimento do saldo da conta vinculada os seus sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, expedido a requerimento do interessado, independente de inventário ou arrolamento;
V – pagamento de parte das prestações decorrentes de financiamento habitacional concedido no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), desde que:
VI – liquidação ou amortização extraordinária do saldo devedor de financiamento imobiliário, observadas as condições estabelecidas pelo Conselho Curador, dentre elas a de que o financiamento seja concedido no âmbito do SFH e haja interstício mínimo de 2 (dois) anos para cada movimentação;
VII – pagamento total ou parcial do preço de aquisição de moradia própria, ou lote urbanizado de interesse social não construído, observadas as seguintes condições: (Redação dada pela Lei nº 11.977, de 2009)
a) o mutuário deverá contar com o mínimo de 3 (três) anos de trabalho sob o regime do FGTS, na mesma empresa ou empresas diferentes;
b) seja a operação financiável nas condições vigentes para o SFH;
VIII – quando o trabalhador permanecer três anos ininterruptos, a partir de 1º de junho de 1990, fora do regime do FGTS, podendo o saque, neste caso, ser efetuado a partir do mês de aniversário do titular da conta. (Redação dada pela Lei nº 8.678, de 1993)
IX – extinção normal do contrato a termo, inclusive o dos trabalhadores temporários regidos pela Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974;
X – suspensão total do trabalho avulso por período igual ou superior a 90 (noventa) dias, comprovada por declaração do sindicato representativo da categoria profissional.
XI – quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for acometido de neoplasia maligna. (Incluído pela Lei nº 8.922, de 1994)
XII – aplicação em quotas de Fundos Mútuos de Privatização, regidos pela Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, permitida a utilização máxima de 50 % (cinqüenta por cento) do saldo existente e disponível em sua conta vinculada do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, na data em que exercer a opção. (Incluído pela Lei nº 9.491, de 1997) (Vide Decreto nº 2.430, 1997)
XIII – quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for portador do vírus HIV; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)
XIV – quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes estiver em estágio terminal, em razão de doença grave, nos termos do regulamento; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)
XV – quando o trabalhador tiver idade igual ou superior a setenta anos. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)
XVI – necessidade pessoal, cuja urgência e gravidade decorra de desastre natural, conforme disposto em regulamento, observadas as seguintes condições: (Incluído pela Lei nº 10.878, de 2004) Regulamento Regulamento
a) o trabalhador deverá ser residente em áreas comprovadamente atingidas de Município ou do Distrito Federal em situação de emergência ou em estado de calamidade pública, formalmente reconhecidos pelo Governo Federal; (Incluído pela Lei nº 10.878, de 2004)
b) a solicitação de movimentação da conta vinculada será admitida até 90 (noventa) dias após a publicação do ato de reconhecimento, pelo Governo Federal, da situação de emergência ou de estado de calamidade pública; e (Incluído pela Lei nº 10.878, de 2004)
c) o valor máximo do saque da conta vinculada será definido na forma do regulamento. (Incluído pela Lei nº 10.878, de 2004)
XVII – integralização de cotas do FI-FGTS, respeitado o disposto no art. 5o, inciso XIII, alínea i, permitida a utilização máxima de dez por cento do saldo existente e disponível na data em que exercer a opção. (Incluído pela Medida Provisória nº 349, de 2007)
XVII – integralização de cotas do FI-FGTS, respeitado o disposto na alínea i do inciso XIII do art. 5o desta Lei, permitida a utilização máxima de 30% (trinta por cento) do saldo existente e disponível na data em que exercer a opção. (Redação dada pela Lei nº 12.087, de 2009)
XVIII – quando o trabalhador com deficiência, por prescrição, necessite adquirir órtese ou prótese para promoção de acessibilidade e de inclusão social. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
XIX – pagamento total ou parcial do preço de aquisição de imóveis da União inscritos em regime de ocupação ou aforamento, a que se referem o art. 4o da Lei no 13.240, de 30 de dezembro de 2015, e o art. 16-A da Lei no 9.636, de 15 de maio de 1998, respectivamente, observadas as seguintes condições: (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
a) o mutuário deverá contar com o mínimo de três anos de trabalho sob o regime do FGTS, na mesma empresa ou em empresas diferentes; (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
b) seja a operação financiável nas condições vigentes para o Sistema Financeiro da Habitação (SFH) ou ainda por intermédio de parcelamento efetuado pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), mediante a contratação da Caixa Econômica Federal como agente financeiro dos contratos de parcelamento; (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
c) sejam observadas as demais regras e condições estabelecidas para uso do FGTS. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
Desta feita, em casos em que a demissão é com justa causa ou o empregado pede demissão, por mais que o dinheiro depositado seja seu, não pode sacar o FGTS. Contra tais impedimentos, atualmente, está em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL – 392/2016) em que o empregado poderia sacar o FGTS, mesmo nos casos de pedido de demissão.
Prescrição da Pretensão de Reclamar Contra o Não Recolhimento da Contribuição do FGTS.
Conforme Agnelo Amorim Filho, citado por Cézar Fiuza[4], “a prescrição é a perda do direito de ação”. Em outras palavras, a prescrição é a extinção da possibilidade de exigir que o seu direito seja cumprido a partir de uma determinação judicial. Após tal o fluxo de prazo, permanece o direito, mas não é mais exigível. Em outras palavras, se perde o direito.
Em relação à prescrição do FGTS, o art. 23, § 5º da lei 8036/90 determina que a prescrição é trintenária, ou seja, de 30 (trinta) anos.
Lei 8.036/90. Art. 23. § 5º O processo de fiscalização, de autuação e de imposição de multas reger-se-á pelo disposto no Título VII da CLT, respeitado o privilégio do FGTS à prescrição trintenária.
Por assim ser, em face do alongamento do prazo fixado pela lei, se levou a um costume de os trabalhadores só exigirem o pagamento dos depósitos do FGTS quando saíam da empresa, para evitar represarias por parte do empregador, afinal, com um prazo de 30 (trinta) anos, raramente o direito era perdido.
Em que pese a disposição legal textualmente evidenciada acima, o Supremo Tribunal Federal, no dia em 13.11.2014, entendeu que tal dispositivo é inconstitucional, pois vai contra o que está disciplinado no art. 7º, XIX, da Constituição Federal, que estabelece que é direito do trabalhador reclamar judicialmente, por meio de ação trabalhista, as verbas circunscritas aos últimos cinco anos do contrato de trabalho, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho. Vejamos o disposto na Constituição Federal:
CF. Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 28, de 25/05/2000)
Neste sentido, vejamos a ementa que afetou o recurso para ser julgamento, com repercussão geral, pelo Supremo Tribunal Federal:
DIREITO DO TRABALHO. FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS). COBRANÇA DE VALORES NÃO PAGOS. PRAZO PRESCRICIONAL. ART. 7º, XXIX, DA CONSTITUIÇÃO. RELEVÂNCIA SOCIAL, ECONÔMICA E JURÍDICA DA MATÉRIA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. (STF. ARE 709212 RG, Relator (a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 25/10/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-099 DIVULG 24-05-2013 PUBLIC 27-05-2013)
O instituto da Repercussão Geral, visa dar mais racionalidade para as decisões judiciais, uniformizar a interpretação constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, estabelecendo tese que passa a ter efeito irradiador e vinculante para todos os Tribunais do País. Nessa sistemática se julgou o ARE 709.212, que foi numerado como o tema 608, em que a controvérsia a ser solucionada, dizia respeito ao “prazo prescricional aplicável à cobrança de valores não depositados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS”, sendo que no plenário da Corte se fixou a seguinte tese “o prazo prescricional aplicável à cobrança de valores não depositados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) é quinquenal, nos termos do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal”, sendo o acórdão assim ementado:
Recurso extraordinário. Direito do Trabalho. Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Cobrança de valores não pagos. Prazo prescricional. Prescrição quinquenal. Art. 7º, XXIX, da Constituição. Superação de entendimento anterior sobre prescrição trintenária. Inconstitucionalidade dos arts. 23, § 5º, da Lei 8.036/1990 e 55 do Regulamento do FGTS aprovado pelo Decreto 99.684/1990. Segurança jurídica. Necessidade de modulação dos efeitos da decisão. Art. 27 da Lei 9.868/1999. Declaração de inconstitucionalidade com efeitos ex nunc. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (STF. ARE 709212, Relator (a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 13/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-032 DIVULG 18-02-2015 PUBLIC 19-02-2015)
A partir da supracitada decisão, o prazo prescricional para cobrança em juízo da ausência do depósito ou dos depósitos do FGTS, por parte do empregado, passou a ser de 5 (cinco) anos e não mais 30 (trinta) anos, como era há décadas.
Tendo em vista tal decisão ser extremamente lesiva ao trabalhador – ainda mais na sistemática da repercussão geral – o STF entendeu por bem modular os seus efeitos, devendo a prescrição ser contada de forma diferente para três tipos de situações: I) casos em que a ciência da lesão ocorreu a partir de 13.11.2014, o prazo de prescrição de 5 (cinco) anos começará a contar desta data; II) casos em que o prazo prescricional já estava em curso em 13/11/2014, o prazo prescricional será o que se consumar primeiro: a) trinta anos, contados do termo inicial; ou, b) cinco anos, a partir de 13/11/2014.
O Tribunal Superior do Trabalho explica bem como funciona tal prescrição, por meio da Súmula nº 362:
Súmula nº 362 do TST
FGTS. PRESCRIÇÃO (nova redação) – Res. 198/2015, republicada em razão de erro material – DEJT divulgado em 12, 15 e 16.06.2015
I – Para os casos em que a ciência da lesão ocorreu a partir de 13.11.2014, é quinquenal a prescrição do direito de reclamar contra o não-recolhimento de contribuição para o FGTS, observado o prazo de dois anos após o término do contrato;
II – Para os casos em que o prazo prescricional já estava em curso em 13.11.2014, aplica-se o prazo prescricional que se consumar primeiro: trinta anos, contados do termo inicial, ou cinco anos, a partir de 13.11.2014 (STF-ARE-709212/DF).
Neste sentido, importante analisar recente julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho sobre o tema:
RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO TRINTENÁRIA. RECOLHIMENTOS DO FGTS. Segundo a diretriz da Súmula nº 362, II, desta Corte Superior, “Para os casos em que o prazo prescricional já estava em curso em 13.11.2014, aplica-se o prazo prescricional que se consumar primeiro: trinta anos, contados do termo inicial, ou cinco anos, a partir de 13.11.2014 (STF-ARE-709212/DF)”. Cumpre registrar que, in casu, não tem aplicabilidade a prescrição quinquenal, em face da decisão do Supremo Tribunal Federal proferida nos autos do processo nº STF-ARE-709212, que declarou a inconstitucionalidade dos arts. 23, § 5º, da Lei nº 8.036/1990 e 55 do Decreto nº 99.684/1990, tendo em vista que aquela Corte Superior modulou os efeitos da referida decisão, de modo que o prazo prescricional quinquenal não se aplica aos casos cuja prescrição tenha se iniciado antes daquele julgamento, hipótese dos autos. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (RR – 10906-11.2017.5.15.0099 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 05/12/2018, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 07/12/2018)
Desta maneira, pode se resumir que atualmente existem situações distintas para três tipos de empregados.
I) Aqueles em que a ausência de depósito do FGTS iniciou após o dia 13.11.2014, sendo que, para estes, o empregado apenas pode exigir o depósito e pagamento dos últimos 5 (cinco) anos, observado o prazo de até dois anos após o término do contrato de trabalho para ajuizamento da ação.
II) Aqueles que, em 13.11.2014, já trabalhavam e o empregador não realizava corretamente os depósitos do FGTS, tendo os 30 (trinta) anos do vínculo empregatício se consumando antes da data 13.11.2019, ou seja, para os trabalhadores que fizerem 30 (trinta) anos de vínculo empregatício antes do dia 13.11.2019 poderão exigir os últimos 30 (trinta) anos.
III) Aqueles que, em 13.11.2014, já trabalhavam e o empregador não realizava corretamente os depósitos do FGTS, tendo a data 13.11.2019 se consumando primeiro que os 30 (trinta) anos do início do vínculo empregatício. Para estes, o prazo prescricional de 5 (cinco) anos começará a fluir a partir do dia 14.11.2019. Significa dizer que se estes trabalhadores podem, até o dia 13.11.2019, reclamar as irregularidades dos últimos 30 (trinta) anos[5]. Sendo que para aqueles que entrarem a partir do dia 14.11.2019, só poderão exigir o depósito e pagamento dos valores dos últimos 5 (cinco) anos, observados o prazo de dois anos após o término do contrato.
Portanto, é de se concluir que os trabalhadores têm o marco do dia 14.11.2019 para exigirem o depósito do FGTS de seus empregadores dos últimos 30 (trinta) anos, sob pena de perderem o direito, só podendo exigir, ultrapassada a data apontada, os últimos 5 (cinco) anos.
Rescisão Indireta em Casos de Ausência de Depósito do FGTS.
A rescisão indireta é um direito do empregado, que equivale a demissão por justa causa, mas é aplicada pelo obreiro no empregador em virtude de falta grave, fazendo jus a todas as verbas devidas, gozando dos mesmos direitos da modalidade de demissão sem justa causa, entre eles, o saldo salarial, aviso prévio indenizado, 13º salário, férias com adicional de 1/3, saque do FGTS, multa rescisória de 40% sobre o FGTS, multa por atrasado do pagamento da rescisão e seguro desemprego.
O ilustre jurista e Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Dr. Maurício Godinho Delgado[6], nos traz preciosa lição sobre a temática:
Os dois tipos de resolução contratual mais importantes existentes na teoria e prática do Direito do Trabalho são, como visto, a ruptura por ato culposo do empregado (chamada de dispensa por justa causa) e a ruptura por ato culposo do empregador (chamada rescisão indireta).
[…]
Ilustrativamente, a tipicidade da conduta faltosa: aqui também aplica-se o critério penalista da prévia tipificação legal da conduta censurada, embora, é claro, se saiba ser relativamente plástica e imprecisa a tipificação celetista. Nesse quadro, as infrações empresariais estão no art. 483 da CLT, em suas alíneas a até g, não se podendo enquadrar como infração conduta do empregador que escape efetivamente à previsão contida na lei laboral.
Tal modalidade está regulamentada pelo art. 483 da CLT, que estabelece os casos em que o empregado pode aplicar a rescisão indireta no empregador, dentre outros motivos, está prevista a hipótese do empregador não cumprir com as obrigações do contrato, dentre elas o depósito do FGTS. Vejamos o mencionado artigo:
CLT. Art. 483 – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
Interessante ressaltar que o empregado pode ou não se desligar do trabalho, enquanto se está a julgar a Reclamação Trabalhista que versa sobre a rescisão indireta, conforme prevê o § 3º do dispositivo acima mencionado:
§ 3º – Nas hipóteses das letras d e g, poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo. (Incluído pela Lei nº 4.825, de 5.11.1965)
Neste sentido, a jurisprudência já se firmou no sentido de que a ausência de depósito do FGTS configura uma das hipóteses em que o empregador não está cumprindo com suas obrigações no contrato, podendo ser aplicada no empregador inadimplentes com suas obrigações contratuais a rescisão indireta, com a cominação da multa de 40% sobre os depósitos do FGTS, conforme se nota no precedente abaixo evidenciado.
RESCISÃO INDIRETA. A ausência dos depósitos do FGTS ou o depósito irregular é, por si só, suficiente para a configuração da hipótese descrita no art. 483, alínea d, da CLT (-não cumprir o empregador as obrigações do contrato-). Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento.(TST – RR: 16284120105020083 1628-41.2010.5.02.0083, Relator: João Batista Brito Pereira, Data de Julgamento: 21/08/2013, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 30/08/2013)
Assim, nos casos em que haja a ausência do depósito do FGTS, o empregado por exigir que sejam feitos, tendo até o dia 13.11.2019 para poder pleitear a integralidade dos últimos 30 (trinta) anos, sendo possível, ainda, requerer a rescisão indireta, com a aplicação da multa de 40% sobre todos os valores devidos, pela falta dos depósitos devido de FGTS.
Conclusões.
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviços (FGTS) é um direito constitucional dos trabalhadores, conquistados por meio de muita luta da classe trabalhadora, na defesa de condições mínimas de trabalho e da vedação da dispensa arbitrária, sendo que tais valores fazem parte do salário do empregado, tendo natureza salarial e alimentar.
Em que pese tal fundo ser de grande popularidade e a ausência dos depósitos ser ilícito de amplo conhecimento, poucos estão esclarecidos sobre a declaração de inconstitucionalidade com a modulação proferidos pelo Supremo Tribunal Federal (ARE 709212), alterando a prescrição de 30 (trinta) para 5 (cinco) anos.
Além do mais, é fato que se tornou um costume de grande parte dos trabalhadores que, mesmo sabendo da ausência de depósito do empregador, deixam para exigir o pagamento após se desligar da empresa. Contudo, desconhecem o fato que, para a grande maiores dos empregados, se deixarem para buscar seus direitos na Justiça após o dia 13.11.2019, só poderão requerer dos últimos 5 (cinco) anos e não mais dos últimos 30 (trinta) anos, causando, em alguns casos, prejuízos de décadas.
Portanto, em que pese o entendimento do Supremo Tribunal Federal ter operado uma releitura da Lei nº 8060/89 com luzes da Constituição Federal, propiciando uma maior segurança jurídica entre os cidadãos, poderá ocasionar um prejuízo a incontável número de trabalhadores, que perderão seus direitos relativos aos recolhimentos do FGTS, por uma única e inescusável razão, o desconhecimento.
08. BIBLIOGRAFIA
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BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452/1943 – Consolidação das leis trabalhistas. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del5452.htm>;
BRASIL. Lei nº 8.036/1990. Dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8036consol.htm>;
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- Advogado, integrante do Escritório Elias Menta Sociedade Individual de Advocacia. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Goiás – UFG. Pós Graduado em prática trabalhista e previdenciária pela UCAM e Mestre em Direitos Humanos pela UFG. ↑
- Advogado, integrante do Escritório Elias Menta Sociedade Individual de Advocacia. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Goiás – UFG e Pós Graduado em Ciências e Legislação do Trabalho pelo IPOG. ↑
- CASSAR, V. B. Direito do Trabalho. 7ª ed. ver. E atual. Rio de Janeiro: Forense. São Paulo: Método, 2012. p.1.159. ↑
- FIUZA, Cézar. Direito Civil, Curso Completo. 18 ed. São Paulo: Revista do Tribunais, 2015, p. 378; ↑
- No mesmo sentido do que se defende são os seguintes precedentes do Tribunal Superior do Trabalho: 1) RR-2036-98.2014.5.03.0136, Red. Min. Márcio Eurico Vitral Amaro, 8ª Turma, DEJT 7/7/2017; 2) AIRR-10768-85.2015.5.15.0011, Rel. Min. Douglas Alencar Rodrigues, 7ª Turma, DEJT 23/6/2017; 3) AIRR-710-39.2015.5.06.0022, Rel. Min. Antonio José de Barros Levenhagen, 5ª Turma, DEJT 26/5/2017; 4) AIRR-747-92.2015.5.23.0022, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, DEJT 10/11/2017; 5) AIRR- 1701-34.2015.5.22.0001, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, DEJT 27/10/2017; 6) AIRR- 2699-96.2015.5.22.0002, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, 2ª Turma, DEJT 27/10/2017. ↑
- DELGADO, M. G. Curso de direito do trabalho. 14ª ed. São Paulo, LTr, 2015. P. 1314/5 ↑